MOBILIDADE URBANA: Competência dos Arquitetos e Urbanistas
21 de setembro de 2018 |
A Mobilidade Urbana é um tema fundamental no debate do desenvolvimento urbano e da qualidade de vida, não só nas disciplinas dos cursos de arquitetura e urbanismo, mas para toda a sociedade. A garantia do Ir e Vir com segurança, eficiência e qualidade e todo o sistema necessário para garantia do deslocamento das pessoas e mercadorias pelos centros urbanos, priorizando os pedestres e diminuindo a desigualdade socioespacial com as famílias de baixa renda impactam as oportunidades de emprego, renda, estudo, lazer, meio ambiente e saúde. Essa agenda tem demandado cada vez mais a atenção dos gestores públicos para adoção de políticas alinhadas para se estabelecer uma mobilidade urbana sustentável, pela escassez de investimentos financeiros, pela necessidade de profissionais qualificados e níveis de gestão pública com setores e instrumentos adequados.
Diante da complexidade deste tema, e de sua importância no dia-a-dia das cidades, é necessária a abordagem na Legislação Urbana vigente e suas aplicações. O maior avanço legislativo para as cidades brasileiras foi a implantação do Estatuto das Cidades (Lei Federal N° 10.257/01) que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal sobre política urbana, ordenamento territorial e desenvolvimento urbano, inclusive sobre a obrigatoriedade dos Planos Diretores. Esta Lei dá ênfase nas políticas urbanas, direito à cidade sustentável, transporte e infraestrutura urbana, gestão democrática e ordenamento territorial com capacidade de desempenho do sistema de mobilidade e condições de deslocamento, com o incremento de instrumentos como: IPTU Progressivo, Outorga Onerosa, Direito de Preempção, Operações Urbanas Consorciadas, entre outros, para gerar aproveitamento de áreas subutilizadas, desempenho das atividades econômicas bem distribuídas e menos concentradas, viabilização de equipamentos públicos como estações e terminais em locais apropriados e melhorar a matriz modal de deslocamentos.
Destaca-se também que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu a responsabilidade para os municípios na gestão do transporte coletivo, sistema viário e de circulação e que no ano de 2012, ficou melhor regulamentado com a sanção da Lei N° 12.587 – Lei da Mobilidade Urbana, que apresenta as diretrizes gerais da política Nacional da Mobilidade Urbana com foco na: acessibilidade universal; desenvolvimento sustentável; acesso ao transporte coletivo; transparência e participação social no planejamento; controle e avaliação da política; segurança nos deslocamentos; uso equilibrado dos espaços públicos de circulação; priorização dos pedestres sobre os veículos motorizados e do coletivo sobre o individual.
A Lei da Mobilidade Urbana além de atribuir as responsabilidades e competências aos municípios também define parâmetro de obrigatoriedade desta organização, exigindo para municípios acima de 20 mil habitantes a elaboração de seus planos e suas revisões a cada 10 anos, o que elevou o número de cidades obrigadas de 38 para 1.663 municípios e prazo do primeiro plano para abril de 2015 e implicando também na criatividade para captação de recursos financeiros e formas de parcerias para sua execução.
De acordo com pesquisa realizada pelo Ministério das Cidades, apenas 5% cumpriram o disposto na lei e 67% das capitais brasileiras não elaboraram o plano de mobilidade urbana.
O crescimento acelerado e desorganizado das cidades e sem a devida expansão de infraestrutura de transportes e trânsito e consequentemente a oferta e prestação dos serviços públicos prejudicou principalmente as famílias de baixa renda. Com a urbanização dos centros urbanos o país deixou de ser rural e assumiu características elevadas de urbano, conforme apresentado na tabela abaixo e previsão de taxa de urbanização de 84,2% para 2020.
Tabela 01 – Crescimento e Urbanização do Brasil
Décadas | Crescimento População Urbana (%) | Taxa de Urbanização | Cidades com população > 500 mil |
1950 – 1960 | 72,0 | 36,2 | 3 |
1960 – 1970 | 66,1 | 45,5 | 6 |
1970 – 1980 | 55,4 | 56,8 | 9 |
1980 – 1990 | 35,8 | 68,9 | 14 |
1990 – 2000 | 21,8 | 77,1 | 31 |
2000 – 2010 | 16,4 | 81,3 | 38 |
Fonte: IBGE, 2.010.
Outra informação importante é a quantidade de municípios que mudaram de patamar na evolução do país e da necessidade de implantação de políticas públicas voltadas para a sustentabilidade da mobilidade, inclusive com a criação de novos, totalizando atualmente 5.570 municípios.
Tabela 02 – Número de municípios e população censo demográfico 2000/2010.
Classe de tamanho da população | Número de Municípios 01/08/2000 | Número de Municípios 01/08/2010 |
Até 10.000 | 2.637 | 2.515 |
De 10.001 a 50.000 | 2.345 | 2.443 |
De 50.001 a 100.000 | 301 | 324 |
De 100.001 a 500.000 | 193 | 245 |
De 500.001 a 1.000.000 | 18 | 23 |
De 1.000.001 a 2.000.000 | 7 | 9 |
De 2.000.001 a 5.000.000 | 4 | 4 |
Acima de 5.000.001 | 2 | 2 |
Total | 5.507 | 5.565 |
Fonte: IBGE, 2010.
Esse cenário vem a ratificar a importância de profissionais qualificados envolvidos na produção e gestão do espaço urbano, tanto como escritórios e projetistas como coordenadores e gestores públicos. Justificando a necessidade de interiorização das ações dos profissionais de arquitetura e urbanismo, hoje concentrados nas capitais e a evidente ausência de escritórios e de técnicos nas funções dos órgãos públicos em cidades de menor porte. Os municípios brasileiros além de não conseguirem elaborar seus planos, apresentam dificuldade em se organizar institucionalmente para gerir as políticas públicas de desenvolvimento urbano.
O que se tem notado é um distanciamento entre a academia e a prática, vários “pseudo-técnicos” embrenhados nas gestões municipais e pouco interesse dos gestores em qualificar e contratar os profissionais adequados à demanda e para a solução dos problemas urbanos. Por outro lado, poucos arquitetos ou escritórios têm buscado se especializar em urbanismo e gestão para prestar a devido consultoria, já que quase 2.000 cidades necessitam de planos, projetos e respectiva implementação. O fato é que muitos municípios ainda necessitam de mão-de-obra qualificada e continuam a crescer sem nenhum tipo de planejamento, comprometendo o futuro destas cidades.
Os desafios para os governos ficaram gigantescos depois de décadas de crescimento urbano acelerado e com pouco planejamento, além de políticas voltadas para o desenvolvimento do transporte motorizado individual em detrimento do transporte público e do transporte não motorizado, também de soluções para alocação de orçamento e de tomada de decisão.
Nos últimos anos houve avanços institucionais e principalmente legislativos, para inverter a lógica individualista e a falta de integração entre o planejamento e a mobilidade urbana. Esforço maior ainda é transformar o arcabouço legal vigente, com avanços significativos, em estruturas de mobilidade que efetivamente beneficiem a população, principalmente na melhoria das condições de mobilidade das pessoas.
Por Alfredo Alves Costa Neto
Arquiteto e Urbanista
Especialista em Gestão Pública